Encontro promovido pelo 39º Núcleo do Cpers reuniu grupos Magister e Sempre Ativas e arrecadou peças de crochê para vítimas da enchente no RS
Professoras e Agentes Educacionais aposentadas de Porto Alegre se reuniram na tarde desta quarta-feira, na sede do Cpers, em Porto Alegre, para discutir a crise climática e as principais demandas da categoria. Além de ser uma confraternização entre os docentes, o encontro Julino de Aposentados – Tecendo Lutas e Solidariedade propôs alternativas diante das políticas constantes de depreciação de escolas, arrocho salarial e corte de benefícios do Governo do Estado.
Uma das principais atividades do encontro foi a produção de peças em tricô e crochê que serão encaminhadas para famílias atingidas pela inundação registrada no estado. Segundo a Professora Leonor Eugênia Ferreira, Tesoureira do 39° Núcleo, a campanha foi uma iniciativa do Departamento dos Aposentados do CPERS. “Para a campanha “Pés Quentinhos”, as aposentadas “teceram” peças em tricô e crochê de sapatinhos a colchas infantis, para crianças e adultos afetados.” Essa campanha dentro do encontro se articulou às falas da professora e da engenheira química que palestraram para o grupo. “Não é só é o fato de fazer um crochê ou um tricô, mas isso tem uma dimensão maior no nosso ato que é discutirmos a falta políticas que são importantes para os aposentados e a vida das pessoas”, completou Leonor.
Além disso, os professores dialogaram sobre os principais fatores que intensificam as consequências das chuvas no território gaúcho (e as formas de sanar possíveis novos eventos climáticos adversos no futuro). Nesse sentido, a flexibilização de legislações ambientais pelo Governador Eduardo Leite (PSDB) e a inércia do prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB) em realizar manutenções no sistema contra cheias na Capital, foram abordadas.
A diretora-geral do 39º núcleo do Cpers, Neiva Lazzarotto destaca que a permissividade do governador com relação ao desmatamento intensificou a catástrofe climática. Em 2020, a Assembleia aprovou a mudança de 480 pontos da lei ambiental no RS, enfraquecendo políticas de fiscalização contra práticas nocivas ao meio ambiente.
“Além de ser responsável por dez anos de arrocho salarial e sucateamento da educação, o governador também deve ser responsabilizado pela destruição do meio ambiente no estado, pois aprovou a toque de caixa a flexibilização da legislação ambiental”, destaca Neiva.
Duas jovens ativistas foram convidadas para apresentar informações detalhadas sobre as origens e os efeitos das fortes chuvas registradas no território gaúcho: a engenheira química e presidente da Associação dos Funcionários da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), Vanessa Rogrigues, e a professora de geografia da rede municipal de ensino de Canoas, Luísa Gomes.
Segundo Vanessa, não serve a alegação do governo gaúcho de que o evento climático ocorreu de uma forma “inesperada”, tendo em vista as duas inundações que ocorreram em setembro e novembro do ano passado na região do Vale do Taquari. Conforme a especialista, esses alertas foram ignorados pelo mandatário gaúcho e intensificaram os prejuízos e mortes. Com o desmatamento cada vez maior no estado, as chuvas escorreram para as áreas urbanas e reduziram a possibilidade de absorção de água pelo solo, o que levou às inundações.
Outros pontos fundamentais das mudanças climáticas, ainda de acordo com Vanessa, são o efeito estufa e o El Niño – caracterizado pelo aquecimento atípico do Oceano Pacífico na linha do Equador. Contudo, ela salienta que a intervenção humana é o principal fator.
“Os cientistas já previam essas mudanças há muito tempo porque o meio ambiente vive dando alertas. Só que muitos diziam que eram “mudanças naturais”, tentando negar a intervenção humana nesse processo. O aumento da temperatura também é resultado do efeito estufa. Os gases agem como isolantes, não deixando o calor se dissipar, o que eleva a temperatura”, salienta.
A crise climática também foi abordada durante a palestra da professora de Geografia, Luísa Gomes. Segundo ela, o território brasileiro é uma das principais referências nas mudanças climáticas – uma vez que o desmatamento e outras ações contra o meio ambiente também afetam todo o mundo.
“O Brasil é um dos protagonistas do que chamamos como “gotas d’água das mudanças climáticas”. Isso não ocorre somente pela destruição da Floresta Amazônica, mas também porque somos um dos pontos mais afetados por essas transformações, com alguns lugares sendo muito mais atingidos do que em outros” destaca Luísa.
Histórias de décadas de experiência na defesa da educação pública
A reunião entre os docentes e agentes educacionais evidenciou um aspecto indissociável da história do Cpers como núcleo de mobilização política: a força dos mais experientes diante de demandas históricas da categoria. A luta por melhores condições de ensino e de remuneração ao longo de décadas ainda norteia a atuação dos professores nos dias atuais, mesmo que não estejam dentro de sala de aula.
“Eu admiro muito essa geração porque ela lutou muito e conseguiu construir um plano de carreira que era muito bom para a classe dos professores na época. Não era um grande salário, mas era justo e garantia aumento de salário. Eles são muito lutadores e não param, temos discussões com professoras de luta que ficam indignadas com a atual realidade”, destaca a Tesoureira do 39° núcleo e integrante do Grupo Sempre Ativas, Leonor Eugênia.
O encontro contou com diversos grupos que representam professores aposentados no estado. Um deles é o Sempre Ativas, dedicado a promover discussões sobre o cenário da educação como um todo.
“Nós discutimos permanentemente a educação. Agora discutimos o porquê de não termos um Plano Nacional de Educação, que está parado. Além disso, nosso Plano de Educação e de Carreira estão prejudicados. Além de abordar isso, nós também discutimos a política, porque somos seres políticos”, comenta a representante do grupo, Carmen Dotto.
Essa noção da importância da continuidade da ação política para a transformação da sociedade também é algo que faz parte da vida da professora aposentada Maria Helena Gallina, que hoje coordena o Magíster, o Fórum de Professores e Funcionários Aposentados no Rio Grande do Sul, cujo objetivo é promover atividades de inclusão junto a professores e funcionários aposentados.
Ao longo de mais de três décadas em que atuou na rede de ensino, Maria desenvolveu projetos sociais junto a estudantes desfavorecidos de zonas periféricas de Caxias do Sul.
“Sempre gostei de trabalhar nessa área educacional para dar oportunidade para toda a comunidade, principalmente para jovens pobres das periferias que vieram a destacar em diversas profissões no futuro”, conta.
A atuação dos professores aposentados se estende para além da discussão política e também visa dar acolhimento a docentes que passam por dificuldades econômicas.
A professora aposentada Édima Silveira Lima de Moraes é coordenadora da Associação Solar do Professor Gaúcho, que há 52 anos disponibiliza casas-lares para professores aposentados no bairro de Lomba Grande, em Novo Hamburgo.
“É uma entidade sem fins lucrativos e assistencial, destinada para professores, funcionários de escola e especialistas de educação. É bem abrangente, para se inscrever realizamos um cadastro. Hoje, apesar da nossa longa história, constatamos que não existe muita procura e queremos divulgar esse serviço”, comenta Édima.
A professora aposentada Lia Damico conta que a mobilização social é algo que sempre fez parte de sua vida. Mesmo com as restrições salariais do cargo, ela relata, orgulhosa, que conseguiu formar os três filhos na educação superior.
“Eu sou sócia do Cpers desde 1955. Meu pai sempre dizia: “A pessoa sozinha não é nada, tem que se juntar. Nós passamos por muita coisa. O tempo de magistério para mim foi muito bom, eu sinto que fiz o que deveria fazer. E mesmo com esse salário baixo, os meus três filhos estão formados: o mais velho é Embaixador, o outro é pós-graduando em Psicologia na UFRGS e outro é advogado”, conta Lia.
A diretora estadual do Cpers, Sandra Terezinha Severo Régio, avalia que a participação dos professores aposentados é essencial para o sindicato, uma vez que compõe a maioria dos associados. De acordo com ela, a inclusão dos mais experientes nas pautas é imprescindível.
“Eles são a categoria que mais vem sofrendo ataques dos governos na retirada dos seus direitos. Estamos na luta para suspender o ataque à previdência, que foi um ataque ao salário dos aposentados. Os nossos aposentados trazem uma caminhada muito rica na construção da educação pública no Rio Grande do Sul”, ressalta a dirigente.
A valorização dos aposentados é uma prática constante do Cpers, visando promover a inclusão sobre os temas de importância para os professores, funcionários de escola e trabalhadores em geral.
“São pessoas que continuam participando dos conselhos do Cpers. Então, mesmo aposentados, continuamos unidos. Essa confraternização é importante, principalmente depois da tragédia que aconteceu no estado. Estamos fazendo um movimento para auxiliar os nossos agentes educacionais que foram atingidos. E também fazemos o nosso trabalho político, porque a política sindical nunca vamos deixar de fazer, isso é importante para nós porque os governos não reconhecem os professores”, destaca a professora Valéria Schemalli Espíndola.
Ato contra sucateamento da educação pública ocorre no dia 12 de julho
A Diretora-geral do 39º núcleo do Cpers aproveitou a oportunidade para convocar os professores para a próxima Assembleia Geral do Cpers, que ocorre na sexta, dia 12 de julho. As pautas são a Revisão Geral dos Salários, Piso Salarial para funcionários de escola e fim do desconto previdenciário para servidores.
“Está em julgamento no STF a inconstitucionalidade de nossa contribuição previdenciária, com um placar de 7 a 3 a favor da ilegalidade desse desconto em nosso salário, mas em função de um pedido de vistas, isso ficou para o mês de setembro. Por isso temos que continuar a mobilização”, destaca Neiva.
No período da manhã, a partir das 9h, os servidores públicos estaduais realizam mobilização em frente ao Palácio Piratini. A Assembleia ocorre a partir das 13h30, na Casa do Gaúcho, no Centro Histórico de Porto Alegre.
Comprometimento de pré-candidatura na defesa da educação
A pré-candidata à vice-prefeita Tamyres Filgueira (Psol) da chapa com Maria do Rosário (PT) pré-candidata à Prefeita de Porto Alegre, depois de acompanhar a Ministra da Cultura no Mercado Público e Quilombo Areal da Baronesa, também esteve presente no encontro e, nas conversas com as educadoras, reforçou o papel essencial dos professores na reconstrução de Porto Alegre após a catástrofe. Segundo ela, a mobilização dos docentes aposentados na discussão de temas importantes para a categoria é uma referência de luta que permanece ativa.
“Essa atividade dos aposentados é muito importante para trazer a experiência e a memória da velha guarda – que passou por períodos conflituosos e decisivos da sociedade, como a ditadura militar e outros momentos de ataque à educação – o sindicato esteve se fortalecendo e defendendo os interesses da categoria, da classe trabalhadora e de uma sociedade emancipadora”, comenta a pré-candidatura.
Ela ressalta que o papel dos educadores é fundamental para repassar conhecimentos sobre o meio ambiente, formando cidadãos conscientes sobre a crise climática – e que possam atuar como agentes transformadores dessa realidade.
“A educação é a chave para a transformação da sociedade. Por isso o debate ambiental é algo que deve ser intensificado e passa pelas salas de aula, por meio das professoras e professores. Eles têm um papel fundamental no desenvolvimento das crianças e na formação do caráter da juventude. Infelizmente nos últimos governos os professores vêm sendo desvalorizados e alvo de ataques, pela falta de investimento e congelamento de salários. E o sindicato tem um papel fundamental nessa luta, onde se constrói a coletividade”, avalia a pré-candidata.
